terça-feira, 22 de junho de 2010

Fé, futebol e liberdade

Matéria divulgada pelo site UOL revela que Kaká ficou descontente com os ataques que teria sofrido por conta de sua declarada fé evangélica, dirigindo tal desabafo ao blog do jornalista Juca Kfouri, onde tais críticas teriam sido feitas. Kfouri se defendeu, alegando que não faz nenhum tipo de ataque direcionado especificamente ao jogador, mas que é sim contra o marketing religioso feito por muitos (Kaká incluso): "Critico sim o merchandising religioso que ele e outros jogadores da Seleção costumam fazer, tentando nos enfiar suas crenças goela abaixo.".
Ok! Fui averiguar a polêmica e encontrei outro texto de Kfouri em seu blog, em que são realmente feitas críticas aos jogadores religiosos, contando inclusive com uma foto de Kaká ajoelhado em campo... Trata-se de uma tradução de artigo do San Francisco Chronicle, mas que ele traduziu sem adicionar nenhum outro comentário, sugerindo que concorda com seu teor, reproduzindo inclusive a mesma imagem de Kaká. No texto há uma afirmação de que a FIFA estaria "rezando para que o Brasil não ganhe a Copa.", por contar com a presença de Lúcio e Kaká, jogadores declaradamente evangélicos, uma vez que a instituição proibiu as manifestações religiosas nas comemorações, justificando que é sempre possível que as mesmas ofendam fiéis de outras religiões.
Até então tudo bem, mas Kfouri acabou deixando passar no texto uma certa vinculação entre o comportamento religioso e o comportamento irracional:

Sejamos intelectualmente sãos por um momento.
Sem dúvida, a Copa do Mundo é positivamente darwiniana – os mais fortes sobrevivem – onde nações de futebol em desenvolvimento podem agora estar maduras para arrancar o Manto Sagrado das mãos das poucas nações escolhidas – Brasil, Itália, Alemanha e Argentina.
(OK, basta. É Deus demais para um domingo…)
A irritação de Kaká veio, certamente, desses pontos todos.
Outro texto de Kfouri, em que afirma que Kaká estaria sofrendo com uma lesão no púbis que deverá afastá-lo do futebol prematuramente, informação colhida pelo jornalista "segundo confidências de médico para médico que chegaram ao conhecimento da coluna horas antes de o Brasil enfrentar a Costa do Marfim.", deve também ter aumentado a insatisfação do jogador. Afinal, como atleta, ele depende da manutenção de uma imagem de saúde que atraia patrocínios.
Qual é o real problema então? De um lado temos os textos de Kfouri aqui apresentados, pelos quais o jornalista recebeu elogios e também muitas críticas diretamente em seu blog, tudo no melhor espírito da liberdade de expressão. De outro temos o desabafo de Kaká e a resposta de Kfouri, ambos também dentro da mesma liberdade. Cada um falou o que quis no momento que quis. Concordo que criticar uma religião não é o mesmo que censurá-la. Kaká se mostrou incomodado com o que considerou uma falta de respeito com sua fé, apontada, ainda que indiretamente, como irracional e autoritária (afinal nos estaria sendo imposta "goela abaixo"). Precisamos então pensar se a liberdade de religião existe e vem sendo respeitada. Não me parece que Kaká seja um defensor da censura e que Kfouri esteja em uma "cruzada" contra os jogadores evangélicos. Fica então a questão: proibir manifestações religiosas pacíficas (como as camisetas dos jogadores) não é o mesmo que estabelecer uma censura sobre o que pode ser expresso pelo indivíduo? Ou seja, se a fé é uma questão pessoal que depende, como tantas outras coisas, da opinião de cada um, limitar sua expressão não é o mesmo que praticar uma censura?

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