sábado, 5 de junho de 2010

Detergente na ficha

Lula sancionou o Ficha Limpa. Com isso passou adiante a bola, para utilizar uma de suas metáforas preferidas. Quem a recebe agora é o Judiciário. O que podemos esperar? Certamente um debate sobre a aplicação da lei, envolvendo os tópicos já destacados pelos noticiários: se ela vai valer já neste ano e se vai levar em consideração as condenações anteriores a sua aprovação. Preocupa o fato de que tudo está passando como se o Judiciário fosse a casa das virtudes absolutas, da isenção plena, da ausência de interesses políticos. Não consigo deixar de pensar que se a questão é manter uma "ficha limpa" vamos presenciar um deslocamento de esforços para que ela assim fique. Teremos uma situação na qual a preocupação não mais será com fazer os escândalos terminarem na famosa massa italiana, mas sim em evitar que a mesma seja sequer colocada no forno. Não temos uma mídia que prima pela isenção e imparcialidade, de modo que podemos contar com um aumento do seu já gigantesco poder de influência junto aos poderes políticos: o segredo vai ser fazer os escândalos não acontecerem e então haja contatos com os proprietários das redes de comunicação. O projeto aumenta também, por motivos semelhantes, o poder político do Judiciário: a absolvição tornou-se um elemento de continuidade da carreira política aos acusados. Tornou-se então outro elemento ao redor do qual veremos barganhas do mais variado colorido partidário. O projeto, uma iniciativa da OAB e da CNBB, é certamente necessário e representa um avanço na direção da nossa reforma política (o que quer que ela signifique realmente). Mas falta muito ainda para que represente a necessária transformação de nosso cenário político o qual, nunca é demais lembrar, envolve não somente os possíveis candidatos aos cargos públicos eletivos.

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