segunda-feira, 26 de julho de 2010

Educação através da força

O projeto de lei que propõe a proibição dos castigos físicos em crianças pode representar uma oportunidade para a sociedade refletir sobre alguns de seus hábitos consolidados. Existe a questão de que a lei procura regulamentar relações da intimidade doméstica, o que dificultará sua efetiva aplicação. Há também a desaprovação da lei pela maioria das pessoas entrevistadas em recente pesquisa do Datafolha. Sem contar ainda a temática das agressões verbais, morais, de fiscalização ainda mais complicada e de efeitos profundos na vida dos jovens.
Os dados da pesquisa do Datafolha merecem destaque: 

  • foram 10.905 pessoas entrevistadas, das quais 54% são contra o projeto de lei e 36% favoráveis;
  • 69% das mães e 44% dos pais já deram algum tipo de castigo físico aos filhos;
  • entre os homens 74% revelaram já terem apanhado dos pais contra 69% das mulheres;
  • No total 72% das pessoas revelaram que já sofreram castigos físicos;
  • 16% afirmaram que sempre apanhavam.

Se não há adesão da maioria ao projeto também não é possível dizer que ele não receba apoio algum. A matéria da Folha mostra ainda que o mesmo tipo de lei não contou com apoio da maioria da população quando foi aprovada em 1980 na Suécia, quadro que hoje é completamente diferente. 21 países da Europa já aprovaram leis similares. Há inclusive uma campanha sobre o assunto feita pelo Conselho da Europa, mas que não conta a adesão de países como França e Reino Unido.
Temos que considerar que as leis não devem expressar necessariamente as vontades imediatas das pessoas, sob o risco de as vermos mudar de acordo com o humor cotidiano da maioria. Ficamos sem saber, porém, um dado muito importante indicado na pesquisa: se os 16% que afirmaram apanhar sempre são favoráveis ou contrários ao projeto de lei. A opinião dos que mais foram castigados poderia levantar várias possibilidades de discussão sobre os impactos da violência na educação dos filhos.
Chama atenção que parece que os homens são castigados em um número pouco superior às mulheres, mas que as mães castigam mais do que os pais. Os dados podem revelar a continuidade dos papéis tradicionais, em que as mães ficam mais tempo cuidando dos filhos e logo acabam castigando mais.
É a mesma cultura de violência que permite que se considere normal as agressões dos homens contra mulheres, como parte do cotidiano dos casais, conforme as declarações infelizes do goleiro Bruno alguns meses antes de sua prisão. Os mais fortes agridem os mais fracos com a justificativa de que querem "educá-los", ou mesmo de que perderam o controle (mas por culpa de algo feito pela vítima da violência). Como vemos ocorrer entre as nações. Sanções são adotadas, navios são invadidos, pessoas são torturadas, inocentes morrem em ataques, tudo em nome da disciplina que supostamente gera a paz. A pesquisa do Datafolha indica que muitas pessoas quando crescem reproduzem o hábito de bater. Parece que não somente dentro de casa.

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