terça-feira, 3 de setembro de 2019

Coringa...

Uma característica de vários quadrinhos de heróis dos EUA são os vilões que nunca morrem. O herói passa um perrengue atrás do outro para derrotar o infeliz e... Lá surge ele novamente. Agora temos o novo filme do Coringa, que está sendo prometido como uma grande bomba de violência. Não vou julgar os méritos de nada disso, mas lançar uma reflexão genérica sobre quais podem ser os impactos sobre uma parcela do público que acompanha tais histórias de um vilão popular que nunca morre (ou morre em universos paralelos e volta...). Há um público dessas histórias que é bastante conservador, basta ver a rapidez com que o Batman virou o símbolo desses movimentos da direita por aqui. por sinal vou ficar restrito ao universo do Cavaleiro das Trevas, já que outros personagens possuem outras perspectivas. Mas o vilão, o Coringa é construído como o arquétipo da maldade racionalizada, apesar de todo discurso sobre sua insanidade. Arkham é o local onde fica trancado somente para fugir, desqualificando todo o trabalho de profissionais dessa área, construindo a imagem de que psicologia e psiquiatria são absolutamente inúteis. E cada vez que o vilão surge é para uma escalada de atrocidades, já que existe a necessidade de continuar prendendo a atenção de quem acompanha. A sensação geral é a de que se a semente de maldade não for eliminada no nascedouro a sociedade irá sucumbir diante da complacência "desse pessoal dos Direitos Humanos", ridicularizados como defensores de marginais sem salvação. E são muitas e muitas histórias do mesmo personagem (ainda o Coringa) comprovando a escalada da maldade. A pessoa sabe que é ficção se parar um instante e refletir. Pode até saber que o personagem surgiu em 1940 e veio sendo atualizado, envelhecendo em algumas histórias e depois ficando jovem novamente na próxima... Mas a mensagem geral já ficou registrada definitivamente, permitindo que todo um conjunto de pessoas não fique indignada diante de um jovem negro que mora nas ruas é que é espancado e chicoteado nu por ter tentado roubar uma barra de chocolate. Quantos de nós não ouvimos de "cidadãos de bem" que tem que ser assim para o rapaz aprender? É a lógica de exterminar a semente da maldade, pela qual pouco importa se a punição não é em absoluto adequada ao crime. Tal lógica não foi criada pelo personagem imaginário, mas ele é parte desse cenário complexo. Lembro aqui, para fechar, da morte de Jason Todd como Robin em 1988. A decisão pela morte dele foi tomada depois de uma votação feita por telefone entre os fãs. E a DC entregou uma morte violenta, com o adolescente sendo emboscado e espancado primeiro pelos capangas do Coringa, para então morrer com golpes de pé de cabra pelas mãos do próprio, que ainda explodiu o local com uma bomba. Oferta e demanda.

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