quinta-feira, 15 de maio de 2014

A beleza que não é para o povo - Pensamentos sobre a Copa e as Olimpíadas

Alguns anos atrás a exposição dos tesouros do czares veio ao Brasil. Eram realmente itens bonitos, com muito ouro e pedras... A única coisa que me veio à mente então, olhando para o folder da exposição, era que tamanha ostentação ocorria às custas da mais absoluta espoliação da população russa, que vivia ciclos de fome, perdiam suas terras para os banqueiros, eram obrigados a entrar para o exército nas guerras definidas pela mesma nobreza e burguesia. Quando a revolução estourou não podia ocorrer nada diferente com os Romanovs mesmo. O problema não era a beleza das peças, mas o fato de que era uma beleza privada, consumida no interior de castelos, inacessível ao povo que a promovia com seu suor e sangue. A situação com a copa e a enxurrada de criticas me lembraram da exposição dos czares. Ninguém dirá conscientemente que não deseja mais investimentos em saúde e educação. Mas imaginar que o belo, que o espetáculo também não é desejado é não entender nada sobre esse mesmo povo que a galera pensa estar defendendo (mas na hora de pagar o salário da faxineira reclama que está muito alto, ou que as empresas pagam muitos encargos trabalhistas...). Cercear o acesso ao que pode ser belo, ao que pode encantar e divertir também é um erro. É a afirmação do Joãzinho Trinta ressoando: "quem gosta de pobreza é intelectual", ou pior, de quem pensa que é intelectual somente por ter lido na Veja... Gostar de um circo algumas vezes não é o problema. O circo não apaga os problemas reais. Receber pão também não é o problema. Existem problemas com a Copa?? Sim. Entre eles o fato de que as empresas privadas (não são estatais) contratadas não estão fazendo o que foram contratadas para fazer. Deveríamos estar sediando a Copa e as Olimpíadas? É algo a ser discutido, mas se ilude muito quem acredita que se não estivéssemos recebendo tais eventos que milagrosamente a educação e a saúde melhorariam rapidamente. Nossos problemas tem raízes mais profundas do que isso. Inclusive na promiscuidade das relações do poder público com os interesses privados (lembrando que são estes últimos que pagam os salários da grande maioria dos brasileiros). Ir para rua gritar que você não quer Copa e Olimpíadas é inútil se não vier calcado em uma agenda de proposta de ações efetivas no sentido de melhorar a educação e a saúde. Mas quando a Dilma conclamou a nação a rediscutir a nossa constituição, a iniciar um grande debate nacional, a proposta morreu, soterrada por críticas e pela ausência de interlocutores (podem criticá-la o quanto quiserem, mas ela fez tal proposta e não havia ninguém organizado para responder).

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